Fertilizantes para ontem, e também para o futuro

Diante da contradição – mais uma – entre discurso e prática do governo, a única saída viável para a crise dos fertilizantes passa pela Petrobrás

fertilizantes
Ministra da Agricultura, Tereza Cristina critica saída da Petrobrás do setor, mas esquece de dizer que privatização das fábricas de fertilizantes ocorreram durante o governo do seu chefe, Bolsonaro (Foto: Reprodução)

Por Albérico Santos Queiroz Filho*

No dia 2 de março, a ministra Tereza Cristina (União Brasil) criticou duramente a decisão do Brasil de abandonar “lá no passado” a produção nacional de fertilizantes. 

Nesse dia, durante coletiva de imprensa para tratar sobre a crise dos insumos para o agronegócio – setor no qual é chamada carinhosamente como “musa veneno” -, a deputada federal licenciada disparou: “Por que tomamos lá no passado a decisão equivocada de não produzir fertilizantes? No passado, a decisão era de importar pois era mais barato. Mas o Brasil precisa tratar esse assunto como segurança nacional e segurança alimentar”. 

Engraçado que, menos de um mês antes desse vislumbre nacionalista, a ministra se colocara como assessora de imprensa ao anunciar, em primeira mão, a venda da Unidade de Fertilizantes Nitrogenados III (UFN-III), até então da Petrobrás, para a Acron – uma empresa russa.

É pouco provável que a ideologia da ministra tenha mudado em tão curto tempo – mesmo que uma guerra envolvendo justamente o maior fornecedor de fertilizantes do Brasil, a Rússia, tenha se iniciado nesse hiato temporal.

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Pois bem, mais curioso ainda é o fato de que o abandono do projeto que visava tornar o país soberano e autônomo no campo dos fertilizantes tenha ocorrido durante o governo de Jair Messias Bolsonaro – que, por sinal, Tereza Cristina participa desde o início, em janeiro de 2019, como ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Ao longo dos últimos três anos, a Petrobrás arrendou as duas fábricas de fertilizantes do Nordeste – por menos de 1% da expectativa de receita anunciada pela própria empresa que fechou o negócio -, hibernou a unidade do Paraná e, agora, vendeu a UFN-III, que poderia suprir uma porcentagem significativa da demanda doméstica.

Escancarada essa contradição entre discurso e prática, é necessário urgentemente cobrarmos um projeto de Estado, de curto, médio e longo prazo para diminuir a dependência externa brasileira na área.

Não podemos esperar que a iniciativa privada assuma as necessidades estratégicas da produção. A Petrobrás possui competência técnica para encabeçar essa iniciativa – incluindo a abertura da UFN-III, que está com 82% das obras concluídas.

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A solução para a crise dos fertilizantes deve ser pra ontem, urgente, mas também de longo prazo. E, para isso, a história mostrou que só existe uma saída: o Estado e sua principal empresa estatal deverão assumir o protagonismo desse processo. 

Precisamos devolver ao povo brasileiro o lucro exorbitante (para não dizer constrangedor) da Petrobrás no ano passado – que foi de 106,6 bilhões – na forma de investimentos, pois inversões na produção de fertilizantes significa também um aquecimento da cadeia produtiva de alimentos, biocombustíveis, biomassa e na produção do Arla 32, além de agregar valor ao gás natural extraído pela própria estatal. 

O momento que o país passa durante a reorganização geopolítica imposta pela guerra na Ucrânia e pelas sanções econômicas à Rússia têm um papel didático pois demonstra, na prática, os riscos de uma gestão voltada ao mercado e não aos interesses do país. 

A manutenção da produção de fertilizantes nas fábricas da Petrobrás é fundamental para absorver as oscilações do mercado externo e garantir a produção do agronegócio, responsável por cerca de 28% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2021.

*Albérico Santos Queiroz Filho é trabalhador da Usina Termelétrica Três Lagoas e diretor do Sindicato Unificado dos Petroleiros do Estado de São Paulo (Sindipetro-SP).

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