“Gestão de planilha” faz explodir horas extras e fere norma de qualidade em Guarulhos

Desde setembro do ano passado, terminal da Transpetro funciona apenas de segunda a sexta-feira; na prática, decisão pode abrir caminho para terceirização de atividade estratégica

terminal guarulhos
Mudança do regime de turno ininterrupto para o regime de polidutos instaurou uma prática de horas extras permanente nos fins de semana (Foto: Reprodução)

Por Guilherme Weimann

Desde o dia 1 de setembro do ano passado, o Terminal de Guarulhos, localizado na região metropolitana de São Paulo (SP), mudou o seu modo de funcionamento. Até então, a unidade da Transpetro – subsidiária integral da Petrobrás responsável pelo transporte e logística de combustíveis – possuía o regime do turno ininterrupto de trabalho, ou seja, os trabalhadores se revezavam em três jornadas de 8 horas, abarcando as 24 horas do dia.

Entretanto, a partir de uma decisão da empresa – publicada em um Documento Interno do Sistema Petrobrás (DIP) –, o terminal passou a operar por meio do regime de polidutos. O argumento era o de aumentar o nível de automação do local, com a realização de algumas obras que garantissem um maior controle remoto por meio do Centro Nacional de Controle e Logística (CNCL), localizado no Rio de Janeiro (SP). Com isso, os operadores, responsáveis pelas tarefas estratégicas, passaram a trabalhar das 6h às 22h, em três turnos, de segunda à sexta-feira.

Em decorrência dessa mudança de regime, os períodos noturnos e os fins de semana passaram a ficar desassistidos. Nestes períodos, um técnico de operação fica de sobreaviso e, caso apareça alguma demanda, é acionado por telefone pelo CNCL. O problema é que, devido às características do terminal, estes acionamentos são frequentes – pelo menos de uma vez ao dia no fim de semana. Por isso, a quantidade de horas extras aumentou substancialmente após a mudança do regime de trabalho.

Leia também: Diminuição do efetivo causa furtos e insegurança no terminal de Barueri

“Desde o princípio, o sindicato indicou que esta mudança precarizaria o trabalho e diminuiria a qualidade dos serviços prestados. Infelizmente, este é o resultado de uma gestão de planilha, que enxerga a empresa apenas através de números”, aponta o diretor do Sindicato Unificado dos Petroleiros do Estado de São Paulo (Sindipetro-SP), Felipe Grubba.

Mais recentemente, para mitigar este efeito colateral do aumento das horas extras, os gerentes apontaram a possibilidade de deslocar terceirizados para cobrir os operadores nos fins de semana.

“Para diminuir os custos que surgiram com a mudança de regime, eles [os gestores] aventaram a ideia de utilizar terceirizados do laboratório para exercerem funções pelas quais eles não são remunerados, muito menos treinados”, afirmou um trabalhador do terminal que preferiu não ser identificado.

Dessa forma, terceirizados poderiam assumir funções estratégicas da unidade, principalmente nos domingos, além de terem acesso a informações sigilosas. “Um trabalhador terceirizado, com condições muito mais precárias, poderá ser compelido a exercer a mesma função que a nossa, o que já seria um absurdo. Mas, do ponto de vista da empresa, informações estratégicas – como os horários e quantidades de combustíveis transportados – serão disponibilizadas para pessoas que estão muito mais sujeitas a pressões externas”, aponta outro operador que preferiu não ser identificado.

Descumprimento das normas

De acordo com a Norma Técnica 2732 (N-2732), que determina parâmetros para o controle da qualidade de produtos e petróleo, tanto na expedição como no recebimento de determinada carga é necessária uma coleta de amostra para verificar a qualidade do combustível – como também constatar possíveis contaminações.

O Terminal de Guarulhos, como indicado pelo próprio site da Petrobrás, recebe derivados de petróleo e álcool da Refinaria de Paulínia (Replan), da Refinaria Henrique Lage (Revap), da Refinaria de Capuava (Recap) e dos terminais de Guararema, São Caetano do Sul e São Sebastião.

Somente neste ano, o terminal operou mais de 2.200 itens, incluindo querosene de aviação (QAV-1) destinada ao Aeroporto Internacional de São Paulo – o segundo maior da América Latina –, localizado em Guarulhos (SP).

“Quando algum item chega ao terminal entre 22h e 6h, além dos fins de semana, não há rastreamento se não houver um trabalhador realizando hora extra. Simplesmente, o produto é despachado pelo centro de controle da Transpetro de forma remota, o que fere as normas de qualidade, que prevê uma amostragem para comprovar se o produto está dentro dos parâmetros adequados”, aponta outro trabalhador que também preferiu não se identificar.

Apesar das obras para adaptação da unidade, os trabalhadores ouvidos pela reportagem informaram que elas não incidiram sobre a capacidade de volume do terminal. “Mesmo com todos os recursos investidos, as modificações acabaram sendo inócuas por não incidir sobre a capacidade de volume”, aponta.

Propostas

Atualmente, o terminal possui 10 operadores que fazem parte do quadro de funcionários próprios da Transpetro. Consensualmente, eles se propõem a retomar o regime de turno ininterrupto de trabalho.

“Os trabalhadores estão dispostos a retomar o regime do turno, o que daria mais previsibilidade a eles, que atualmente sempre precisam fazer horas extras e ficar de sobreaviso; diminuiria os custos da empresa; e ainda voltaria a atender todas as normas de qualidade exigidas”, aponta Grubba.

Além disso, a partir do diálogo com os trabalhadores, o Sindipetro-SP também chegou à conclusão de que o retorno ao regime de turno também facilitaria a integração da operação com a base de carregamento do terminal. Isso abriria a possibilidade do carregamento de caminhões para transporte de combustíveis ser otimizado, funcionamento 24 horas por dia.

O sindicalista, que também é petroleiro da Transpetro, afirma que as propostas contemplam interesses mútuos – da empresa e dos trabalhadores.

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