Segundo Henrique Jäger, venda da RLAM impactará em toda a infraestrutura de importação de produtos do país
Por Odara Monteiro, sob supervisão
No início do mês, após realizar uma auditoria sobre as consequências que o país poderá sofrer com a venda de refinarias da Petrobrás, o Tribunal de Contas da União (TCU) emitiu um parecer relatando que a privatização poderá ocasionar desabastecimento em mais de uma região do país. O relatório do ministro Walton Alencar Rodrigues constatou “haver risco ao desenvolvimento e à reorganização do mercado de refino do petróleo no Brasil”. A auditoria ainda apontou que o mercado seguirá sob o risco de continuar fechado, uma vez que se perde o controle da infraestrutura para a movimentação e estoque de combustíveis.
Em nota, a Federação Única dos Petroleiros (FUP) informou que os efeitos negativos da criação destes monopólios regionais privados já foram constatados também por estudos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).
Com o oitavo maior parque de refino do mundo e capacidade para processar 2,3 milhões de barris de petróleo/dia, a Petrobrás foi articulada para integrar o país, de maneira que as refinarias funcionassem sob um esquema de complementaridade, para que uma suprisse eventuais necessidades das outras. Com a privatização e retirada da estatal do segmento de refino em grande parte das regiões do país (com exceção da região sudeste, no eixo RJ-SP), é previsto o rompimento deste sistema integrado.
Leia também: Oito motivos para ser contra a privatização da Petrobrás
Economista, pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), ex-presidente da Petros e assessor da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Henrique Jäger alerta sobre a falta de coordenação de abastecimento dos derivados uma vez que as refinarias da Petrobrás forem entregue à iniciativa privada: “Com a privatização da RLAM, é necessário notar-se que, além da refinaria, está sendo entregue à iniciativa privada todo o sistema de armazenamento e tancagem, bem como os portos e toda a infraestrutura necessária para a importação de produtos”.
Caso o processo de venda da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), na Bahia, seja concretizado, toda a infraestrutura da unidade, bem como os ativos estatais, ficarão sob controle do Fundo Mubadala, de Abu Dhabi. Desta maneira, não existe mais a garantia de abastecimento das demais refinarias do país.
Leia mais: Divergindo de grandes petroleiras, Petrobrás abre mão do ramo petroquímico
O pesquisador alertou ainda para o déficit enorme de derivados que será causado nas regiões Norte e Nordeste, na Refinaria Isaac Sabbá (REMAN), em Manaus, e na Refinaria Abreu Lima (RNEST), em Pernambuco, respectivamente, sem um parque de refino que consiga prover para os 25% da população brasileira congregados nesta região.
Provavelmente no final dessa década (em meados de 2028), você vai ter um déficit muito grande de derivados. A estimativa da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), empresa de autarquia do governo, é que precisaria ser importado um volume de diesel igual ao volume que é produzido atualmente para o Nordeste, e esse processo vai se acirrar com a privatização, daí o risco de termos um apagão, porque não vamos ter mais ninguém cumprindo o papel que a Petrobrás cumpria, de garantir o abastecimento em todas as regiões do Brasil. Isso vai estar na mão da iniciativa privada, que pode fazer ou não, fica à função dos seus interesses de rentabilidade.
Em relação à análise do processo pelo TCU, Jäger afirma não manter expectativas de que o órgão reverta a decisão da venda das refinarias por conta da atuação política que a entidade dispõe, mas reconhece que “o mesmo traz informações que podem ser usadas pelo movimento sindical para mobilizar a sociedade”.
O economista também declarou que a posição política do TCU não pede para que o processo seja revertido, e sim aperfeiçoado, o que, de acordo com a FUP, “não cabe aperfeiçoamento, somente caberia a interrupção da venda das refinarias, pois as consequências desse processo serão drásticas para a sociedade e para o país”.