Benzeno mata: petroleiros debatem saúde e segurança em seminário do Sindipetro

Evento reuniu trabalhadores, diretores e perita para discutir relatórios sobre exposição a agentes nocivos na Replan

Petroleiros, diretores do Sindipetro Unificado e especialistas durante o 1º Seminário de Agentes Nocivos e Saúde do Trabalhador na Replan (Foto: Vítor Peruch/Sindipetro Unificado)

Por Vítor Peruch

O Sindipetro Unificado realizou nesta terça-feira (28) o 1º Seminário de Agentes Nocivos e Saúde do Trabalhador, na regional Campinas, com a presença de petroleiros e da engenheira e perita Vanessa Farias. O encontro marcou a conclusão da primeira etapa de um processo de avaliação das condições de trabalho e exposição a substâncias como o benzeno na Refinaria de Paulínia (Replan).

Ao longo de um ano e meio, o trabalho foi construído de forma conjunta entre trabalhadores, sindicato e a perita Vanessa Farias, com participação ativa em todas as etapas — das visitas técnicas às reuniões de análise. O seminário desta terça-feira manteve essa mesma dinâmica: petroleiros e petroleiras apresentaram os resultados de suas áreas, o sindicato coordenou os debates e a perita contribuiu com a avaliação técnica, reafirmando o caráter coletivo e participativo de todo o processo.

A abertura foi conduzida pelo diretor Rodrigo Zanetti, que apresentou o histórico do trabalho desenvolvido em parceria com a perita. Ele explicou que o acompanhamento técnico surgiu a partir de um artigo do Acordo Coletivo de Trabalho (ACT), que garante a escuta dos trabalhadores. “Na primeira medição feita na bomba, já constatamos vazamento”, destacou. Segundo ele, o relatório com esses dados deve agora orientar os próximos encaminhamentos junto à empresa.

Zanetti também apresentou o relatório de avaliação da exposição a agentes nocivos no setor de Craqueamento, ressaltando a diferença entre “saúde do trabalho” e “saúde do trabalhador”.

Na sequência, o diretor Carlos Reis iniciou as apresentações por área da refinaria. Ele traçou um paralelo entre o filme Alien e a rotina dos petroleiros. “A gente quer uma mudança estrutural, mas também precisamos de uma mudança cultural. Segurança e saúde devem ser ensinadas nas escolas e transformadas em cultura do trabalho. Antigamente, capacete e cinto de segurança não eram usados. Precisamos mudar esse pensamento também”, afirmou.

Durante a manhã, trabalhadores apresentaram avaliações sobre suas áreas: Evandro Botteon (HDT), Arthur Bob Ragusa (Coque), Eric (TE), finalizando com a equipe de utilidades (ETA, vapor e elétrica) e do laboratório.

Após o almoço na sede do sindicato, Vanessa Farias apresentou um balanço do estudo realizado até agora. Ela alertou que o processo está em andamento. “O trabalho não para aqui. Hoje mesmo surgiram novas dúvidas e novas ideias que devem agregar na continuidade deste trabalho”, afirmou.

O diretor do Sindipetro Unificado, Rodrigo Marmerola, destacou a importância do processo coletivo que resultou no seminário. “Este trabalho foi muito importante. Agradeço a todos que se envolveram desde o início, nas visitas e reuniões. Quando os trabalhadores tomam consciência das condições a que estão expostos, a gente se fortalece como categoria”, afirmou.

O coordenador-geral do Sindipetro Unificado, Steve Austin, também ressaltou o esforço conjunto. “Primeiro, quero agradecer ao Zanetti, ao Reis, à Vanessa e a todos os petroleiros que tocaram esse trabalho ao longo do último ano e meio, com diversas reuniões e muito envolvimento. Isso faz parte da formação do militante, do trabalhador, e inspira outras pessoas. Como a Vanessa disse, este é um trabalho coletivo, capilarizado na base”, disse.

Steve ainda alertou para a importância da audiência pública sobre os riscos da exposição ao benzeno, que ocorrerá em 10 de novembro de 2025, a partir das 9h, na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado Federal, em Brasília. “Precisamos participar. É um momento importante para que a voz dos trabalhadores seja ouvida também em nível nacional”, concluiu.

No seu encerramento, o coordenador-geral reafirmou a posição do sindicato sobre o tema. “Nossa posição é a seguinte: não existe limite de tolerância para o benzeno. Benzeno é veneno, benzeno mata”, declarou Steve Austin.

A diretora do Sindipetro Unificado, Maju Wegher, criticou a lógica econômica que, segundo ela, ainda orienta as decisões da empresa em temas de saúde e segurança. “É tudo sobre o ‘mais economicamente viável’. Parece que a empresa prefere pagar uma indenização de vez em quando do que mudar um sistema que vem afetando a saúde de todos os trabalhadores. A impressão que fica é que a peça mais barata de ser trocada é sempre o peão”, afirmou.

Pesquisadoras especialistas presentes

Também participaram do seminário as pesquisadoras Leda Leal, June Maria Passos Rezende  e Arline Arcuri, especialistas brasileiras em saúde do trabalhador, que contribuíram com a elaboração do relatório técnico. Leda, pesquisadora aposentada da Fundacentro, é doutora em Ergonomia e especialista em Medicina, Higiene e Segurança Profissionais. Arline, também da Fundacentro, é doutora em Ciências na área de Físico-Química e tem longa trajetória em pesquisas sobre exposição ocupacional a agentes químicos. Já June Maria Passos Rezende é médica e doutoranda em Saúde Coletiva pela Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), atuou como Auditora-Fiscal do Trabalho, ligada ao Ministério do Trabalho e tem seu foco na saúde do trabalhador, especialmente no que se refere aos efeitos da exposição ao benzeno.

A pesquisadora Leda Leal abriu sua fala destacando a emoção de reencontrar, no seminário, um tema que a acompanha há mais de quatro décadas. “Viajei pelo tempo com as apresentações de vocês, me lembrando do trabalho que fiz com os petroleiros. Comecei a atuar com a questão dos efetivos em 1990 e meu último trabalho foi uma análise da O&M. É muito emocionante estar aqui ouvindo vocês”, afirmou.

Leda elogiou o envolvimento da categoria e a qualidade do material produzido. “Assim como disse um companheiro no início do seminário, acho que todos vamos sair daqui melhores do que entramos. Vocês fizeram um ótimo trabalho — muito melhor do que qualquer consultoria privada ou estatal faria. Já vi vários relatórios dessas consultorias que não chegam nem aos pés do que vocês apresentaram. Além disso, conseguiram ter uma noção mais ampla do conjunto, para além do próprio local de trabalho”, destacou.

A pesquisadora Arline Arcuri iniciou sua fala parabenizando a engenheira Vanessa Farias e os petroleiros pelo trabalho desenvolvido. “Quero parabenizar demais a Vanessa pelo trabalho que ela fez. Logo que entrei na Fundacentro, em 1990, realizamos um levantamento de riscos na Revap, e posso dizer que foi anos-luz menos produtivo do que este. Um trabalho muito menos participativo do que o que vocês fizeram agora. A primeira coisa que deve ser valorizada é o método — o método de consulta, o método de pesquisa com os trabalhadores”, afirmou.

Arline também destacou a importância de que a Petrobrás estenda o prestígio que tem enquanto principal empresa estatal brasileira à forma como trata a saúde e a segurança de seus trabalhadores. “Gostaria que a Petrobrás tivesse o mesmo respeito que tem como grande empresa estatal também com os trabalhos voltados à saúde e segurança dos trabalhadores”, afirmou.

A médica e pesquisadora June Maria Passos Rezende, doutoranda em Saúde Coletiva pela Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp e ex-Auditora-Fiscal do Trabalho em Curitiba (PR), destacou a importância do conhecimento produzido pelos próprios trabalhadores. “O que eu estou vendo aqui hoje é uma experiência que revela a riqueza do saber dos trabalhadores. Aprendemos muito com isso. A produção de conhecimento coletiva tem várias formas de acontecer, e a forma que vocês realizaram foi muito rica. Só tenho uma observação: há muito trabalho pela frente ainda!”, afirmou.

O seminário encerrou com um debate aberto, em que os petroleiros levantaram questionamentos e sugestões sobre as próximas etapas. A direção do Sindipetro destacou que os relatórios serão utilizados como instrumento de luta por melhores condições de saúde e segurança na refinaria.

 

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