Abertura do evento contou com uma aula do ex-presidente da Petrobrás e professor aposentado da UFBA, José Sérgio Gabrielli

Por Guilherme Weimann
Nesta segunda-feira (27), a Plataforma Operária e Camponesa da Energia realiza o Seminário Nacional “Realidades e Perspectivas da Transição Energética na Ótica dos Trabalhadores”, na sede de São Paulo do Sindipetro Unificado. A primeira mesa do evento contou uma aula do ex-presidente da Petrobrás [2005-2012] e professor aposentado de Economia da Universidade Federal da Bahia, José Sérgio Gabrielli.
Logo no início da sua exposição, o economista demarcou o caráter político do debate: “Poder e energia são sinônimos. Quem controla a energia, a fonte primária, a fonte natural, e as ferramentas e os equipamentos para transformar e utilizar essa energia, controla as sociedades”.
Nesse sentido, o professor recordou que na língua inglesa, as empresas de energia são conhecidas como ‘power companies’, termo que poderia ser traduzido para o português tanto como ‘companhias de energia’, como, de maneira mais literal, como ‘companhias de poder’.
Histórico e definição
No mundo, existem diversas fontes primárias de energia que foram descobertas ao longo dos últimos séculos, como: água, lenha, biocombustível, carvão e petróleo. De acordo com Gabrielli, historicamente, a transição energética é justamente a mudança de posição relativa dessas fontes primárias de energia.
Um exemplo histórico desse fenômeno, é a utilização de óleo de baleia para iluminar as principais metrópoles do mundo. Com a diminuição desses animais, houve uma transição forçada para o carvão como fonte para a geração de eletricidade. Entretanto, de maneira geral, o surgimento e o protagonismo de uma nova fonte de energia não excluem as outras, que conviveram simultaneamente ao longo dos séculos.
Hoje, todavia, há um fenômeno diferente no debate da transição energética. Se no passado a transição ocorreu por escassez de uma fonte primária ou para melhorar a eficiência, atualmente a transição energética está sendo imposta por questões ambientais e pelas mudanças climáticas – ambas afetadas pelas emissões de gases que ocorrem não necessariamente na produção, mas no consumo de energia.
Alternativas
A partir desse cenário, Gabrielli refletiu sobre as alternativas tecnológicas existentes. No campo da eletricidade, o professor apontou: “Energia solar é intermitente, varia muito. Os sistemas de distribuição de energia foram pensados na variação do consumo, e não da oferta. E a geração de energia solar tem uma variação muito grande, o que gera um desequilíbrio. Nós estamos tendo apagões não por falta, mas por excesso de energia”.
Já no setor da mobilidade, o economista afirmou: “Atualmente, 97% da energia responsável pela mobilidade no mundo é proveniente do petróleo. Quais são os principais derivados do petróleo? O principal é o diesel, depois gasolina, GLP, óleos lubrificantes… Todos esses derivados saem das refinarias. No caso do diesel, qual o setor que mais utiliza diesel? O transporte pesado. Para longas distâncias, não existe alternativa para o diesel”.
Se para o diesel ainda não existe uma alternativa viável no caso do transporte de longas distâncias, a indústria já está desenvolvendo e oferecendo um produto no mercado: “Qual o setor que mais utiliza gasolina? Os veículos leves. E a bateria elétrica é uma alternativa. A produção de carros elétricos está crescendo muito, principalmente na China”.
Além disso, está ocorrendo o incentivo da utilização de furgões movidos à gás, principalmente na África. Mas esse cenário deverá gerar um efeito colateral: “Com a diminuição do consumo da gasolina e do gás, vai haver um colapso de algumas refinarias, que não conseguem gerar apenas um derivado, de maneira isolada”.
Desafios
A transição energética é contemporânea, de acordo com Gabrielli, ou seja, de diversas outras transições: a transição digital, tecnológica e dos produtos. “Hoje temos uma expansão acelerada da inteligência artificial, robótica, dos telefones ultra inteligentes, da miniaturização dos produtos. E tudo isso demanda muita energia. Uma consulta simples no ChatGPT gasta o equivalente a cinco minutos de uma lâmpada de 60 watts ligada. Os data centers gastam muita energia”, explica.
Além disso, existe um desafio histórico a ser enfrentado: “Precisamos falar sobre a pobreza energética, condição que atinge cerca de 2,5 bilhões de pessoas no mundo, incluindo o uso doméstico e a mobilidade. Nós temos 2,1 bilhões de pessoas no mundo cozinhando à lenha. Essa pobreza energética é invisibilidade para muita gente, mas precisamos torná-la visível”.
O professor ainda chamou a atenção de outro efeito colateral da busca por outras fontes de geração de energia: “Onde se dá essa produção de energia eólica e solar? Em áreas mais isoladas. E essa produção afeta diretamente as populações locais. Se não houver uma regulação do Estado para proteger essas comunidades, elas sofrerão – já estão sofrendo – diversas consequências”.
Por fim, Gabrielli recordou a origem do termo ‘transição energética’: “O conceito de transição energética começou com o sindicalismo estadunidense para proteger os trabalhadores que estavam sendo afetados pela poluição, pela chuva ácida, que eram os carvoeiros. Mas é necessário expandir essa pauta para além da defesa do trabalho, para não se isolar. A transição energética justa é uma pauta da sociedade como um todo”.
Seminário
O seminário continua no período da tarde, com a presença da professora de Economia da Unicamp, Marilane Teixeira. A iniciativa faz parte do processo de preparação para a Cúpula dos Povos, que acontecerá em Belém (PA), no próximo mês de novembro, e promete ser um marco na luta por um novo modelo energético baseado na soberania nacional, justiça social e ambiental.


