Ato pela vida: “Sempre quem morre é o peão”

Trabalhadores da Refinaria de Paulínia (Replan) realizaram ato exigindo melhores condições de segurança no trabalho, após mortes no Sistema Petrobrás

Em meio à dor e indignação, colegas de profissão exigiram justiça e mudanças urgentes, para que mais vidas não sejam ceifadas no Sistema Petrobrás (Foto: Vítor Peruch)

Por Vítor Peruch

Morte, tragédia, vidas interrompidas. Trabalhadores que saíram de casa para mais um dia de labuta e nunca mais voltaram. Esse foi o peso que dominou o ato desta sexta-feira (10), na portaria norte da Refinaria de Paulínia (Replan). Ali, vozes ecoaram em protesto contra a negligência que transforma o local de trabalho em um campo de riscos fatais. Em meio à dor e indignação, colegas de profissão exigiram justiça e mudanças urgentes, para que mais vidas não sejam ceifadas no Sistema Petrobrás.

O ato ocorreu junto com outros atos pelo país, organizados pela Federação Única dos Petroleiros (FUP). Na Replan, a mobilização foi convocada pelo Sindipetro Unificado, com o apoio do Sindicato dos Metalúrgicos de Campinas e do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e do Mobiliário de Campinas e Região. O evento começou por volta das 6h e se estendeu até as 9h30, com o objetivo de cobrar medidas de segurança e responsabilização das empresas envolvidas nos recentes acidentes fatais nas áreas da Petrobrás.

O lucro não vale a vida

Em resposta às recentes mortes de trabalhadores, a FUP suspendeu a negociação da PLR e exigiu uma reunião emergencial com a Petrobrás para discutir a política de saúde e segurança no trabalho (SMS). Em apenas 72 horas, três trabalhadores perderam a vida em acidentes: o projetista Petherson Katika, de 25 anos, na Repar (PR); a engenheira Rafaela de Araújo, de 27 anos, no Terminal de Cabiúnas (RJ); e o técnico Edson Almeida, a bordo do FPSO Cidade de Niterói. Essas tragédias, diretamente ligadas à precarização das condições de trabalho, levaram a federação a intensificar os protestos. A FUP e seussindicatos argumentam que não faz sentido negociar lucros enquanto a vida dos trabalhadores está em risco, cobrando mudanças imediatas na política de segurança para evitar mais tragédias e proteger quem constrói a riqueza da Petrobrás.

Replan de luta

Na Replan, o ato teve grande adesão dos trabalhadores e começou com as falas do petroleiro Gustavo Marsaioli, que reforçou a importância do coletivo na luta por melhores condições de trabalho. “Precisamos do coletivo para cobrar da empresa que ela dê as condições de trabalho necessárias. Ninguém tem que se machucar. Ninguém tem que se expor a riscos”, disse Marsaioli. Ele também criticou a reforma trabalhista, questionando a injustiça de expor trabalhadores mais velhos a atividades pesadas: “Alguém consegue imaginar um cara com 63 anos, subindo escada, fechando válvulas ou desmontando andaimes? Isso é justo?”.

O diretor da FUP e do Sindipetro Unificado, Juliano Deptula, criticou o atual modelo de gestão que, embora tenha gerado mais empregos, ainda trata a segurança de forma inadequada: “Nossa briga é para que esses empregos, especialmente dos terceirizados, tenham mais qualidade. E isso não é só sobre salários e benefícios, mas sobre segurança no trabalho. Precisamos ter a garantia de que vamos entrar para trabalhar e sair com vida”, Ele também reforçou que é inadmissível que a gestão da Petrobrás mantenha uma política antiquada e burocrática em relação à saúde e segurança.

Steve Austin, diretor do Sindipetro Unificado, lembrou que os acidentes de trabalho vão além de lesões físicas, destacando o impacto da pressão psicológica. “Quando falamos em acidente de trabalho, não estamos falando só daqueles que cortam, ferem e até matam o trabalhador. Tem muito acidente que nem fica registrado, porque é a pressão psicológica, a pressão para entregar resultados, para manter seu emprego”, afirmou Austin, apontando o clima de insegurança constante enfrentado pelos trabalhadores.

O diretor do Sindipetro Unificado, Rodrigo Alves de Araújo, destacou a abertura para o diálogo que a gestão da Petrobrás vem apresentando, mas enfatizou que é necessário continuar pressionando por segurança. “A gestão tem mais abertura para diálogo, vemos alguns avanços, mas é fundamental cobrar segurança e dignidade para o trabalhador. Não podemos aceitar que uma família receba a notícia de que seu ente faleceu cumprindo seu dever laboral dentro do Sistema Petrobrás”.

Amilton Mendes, coordenador do Sinticom, criticou o impacto do sucateamento da legislação trabalhista e a ausência de políticas voltadas para a saúde e segurança do trabalhador. “Enquanto vamos chorando nossas mortes, a Petrobrás segue pagando seus dividendos para os acionistas! O dinheiro que era para investir em infraestrutura vai para o bolso dos acionistas. A vida do trabalhador não pode ser tratada dessa forma”, declarou Mendes.

Jair dos Santos, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Campinas, encerrou o ato com uma fala emocionada e uma oração pelas vítimas. “Tudo que é construído, é construído pelas mãos de peão. A classe trabalhadora sustenta toda a riqueza da nação. Não é aceitável que a gente saia de casa de madrugada e, ao final do dia exaustivo de trabalho, possamos voltar para casa dentro de um caixão. E não morre nenhum dono de empresa! Quem morre sempre é o peão!”, afirmou Jair. Ele reforçou a necessidade de solidariedade entre os trabalhadores: “Você cuida de mim, e eu cuido de você, e aí no final do trabalho nós saímos juntos, vivos, e voltamos para nossas famílias. Firmes, e a luta continua”.

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