No mundo do trabalho, a capacidade de menos trabalhadores produzirem mais valor gera sobrecarga para quem está empregado e desemprego estrutural na outra ponta

Por Carlos Salazar*
Olhando para a História, toda revolução técnica vem, em geral, acompanhada de transformações econômicas no mundo da produção, das classes sociais e na distribuição da riqueza. A primeira revolução industrial, por exemplo, produziu mudanças na economia que expulsaram o grosso da mão de obra do campo, que foi incorporado na indústria. E, na política, burgueses cortaram a cabeça de nobres em frente aos seus palácios.
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As transformações que agora vivemos alteraram o comando da produção e a gestão financeira passou a preponderar sobre a sociedade. A racionalidade do contador e do economista se sobrepôs à racionalidade dos técnicos e dos engenheiros. No mundo ideal da finança vencem, sobre qualquer outro tipo de ética social, econômica ou ambiental, a governança e a gestão de metas que pretendem otimizar os indicadores adotados pelos gestores, os burocratas do mercado.
No mundo do trabalho, a capacidade de menos trabalhadores produzirem mais valor gera sobrecarga para quem está empregado e desemprego estrutural na outra ponta. Se enfraquece o potencial de negociação dos trabalhadores frente aos seus empregadores: pioram os salários, as condições de trabalho, a qualidade de transporte, da alimentação, diminui o acesso a bons serviços de saúde, educação, previdência e lazer.
Neste contexto, vieram a terceirização, a pejotização, os freelancers, os microempreendedores individuais – mecanismos de flexibilização dos direitos civis conquistados pelos trabalhadores nos últimos séculos. Ironicamente, os trabalhadores passaram a ser chamados de “colaboradores” por esses burocratas a quem importam muito pouco as diferenças reais entre a produção de querosene de aviação, de uma fábrica de sapatos ou picolés, tudo vira meta!
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Estamos diante de uma das maiores revoluções tecnológicas e econômicas da sociedade, nunca foi tão poderosa a capacidade de deslocamento de mercadorias, informações e pessoas pelo globo. Nunca extraímos tantos minérios, nem produzimos tantas catástrofes ambientais. Nunca tivemos tantos bilionários, nem tantos miseráveis. Nem nunca fomos capazes de produzir tanto com custos decrescentes. Os problemas da superprodução e da má distribuição da riqueza não são técnicos, são políticos. Resta saber qual solução política encontraremos hoje para aquilo que já foi resolvido com machado e guilhotina.
*Carlos Salazar é doutorando em Geografia na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).