Petrobrás aumenta refino de petróleo do pré-sal, mas bate recorde de importação

Apesar da aparente contradição, segundo especialista, a resposta da incoerência está está na privatização das refinarias da companhia

No mesmo cenário de crescimento em refino de petróleo extraído do pré-sal, a Petrobrás diminuiu a produção do diesel e aumentou a importação do derivado (Foto: Agência Petrobrás)

Por Petróleo dos Brasileiros

No fim de maio, a Petrobrás divulgou crescimento no refino de petróleo extraído do pré-sal, representando 55% dos derivados processados pela companhia e alcançando uma marca de 1,186 milhão de barris diariamente somente entre os quatro primeiros meses deste ano, uma alta de 30% se comparado a média de todo o ano passado.

Por originar combustíveis como diesel e querosene de aviação menos poluentes, devido ao menor teor de enxofre, os petróleos do pré-sal possuem uma melhor qualidade e, segundo a estatal, o aumento no refino deste óleo faz parte da busca por crescimento das atividades de “formas sustentáveis”.

Outra característica positiva do petróleo de pré-sal é a alta parafinicidade do produto, que aumenta a qualidade e, se comparado ao extraído do pós-sal, maior valor agregado do diesel produzido a partir deste óleo.

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Simultaneamente, a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) apontou que, no mês de abril, a Petrobrás estava produzindo menos diesel porque a importação cresceu em 57,2% em comparação a março, maior valor para o mês desde 2013.

No total, em abril foram importados nacionalmente 1,4 milhão de metros cúbicos de combustível, responsável pela produção e locomoção de vários produtos, porque é utilizado em maquinários e veículos transportadores de cargas, dessa quantidade, 47,7% ficou com a Petrobrás.

É de se estranhar como, ao mesmo passo em que aumenta o refino de óleo com maior qualidade, a companhia aumenta a necessidade de importar combustível de fora. Para especialistas, esse aumento ocorre devido ao aumento de demanda e, principalmente, à queda da produção nacional de diesel.

A empresa, ao colocar metade do seu parque de refino à venda, diminui a produção de combustíveis em território brasileiro, necessitando de uma maior importação de produtos, que impacta diretamente no bolso do consumidor visto que estes são comercializados em dólar e o real, na conjuntura atual, está desvalorizado.

Diminuição do parque de refino

Para o economista, sociólogo e diretor-técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), William Nozaki, a decisão da Petrobrás em focar na qualidade dos derivados de petróleo obtidos através do pré-sal evidencia a concentração das atividades da estatal no polígono do pré-sal, localizado na região Sudeste, o que provoca o aumento de importações para que se possa suprir as necessidades de outras regiões que tiveram refinarias postas a venda.

A questão por trás desta problemática é que, exatamente porque o pré-sal tem uma produtividade maior e de melhor qualidade, a Petrobrás avaliou que poderia abrir mão de suas outras refinarias.

WILLIAM NOZAKI, ECONOMISTA E DIRETOR-TÉCNICO DO INEEP

Ao agir assim, segundo Nozaki, a empresa decide concentrar sua produção nos ativos de classe mundial e na região Sudeste, ignorando o restante do país. “Isso demonstra que ela não está preocupada com o abastecimento do mercado interno e sim, com os ganhos oriundos do pré-sal e maximização dos lucros para acionistas”, afirma.

Tal decisão tem como resultado a ociosidade nas refinarias pertencentes à companhia, que representam números de patamares inferiores se comparados aos recordes de produção de petróleo. Segundo a ANP, somente em 2020, as refinarias da Petrobrás trabalharam com aproximadamente 30% a menos da capacidade total.

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Antes da venda da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), na Bahia, de acordo com Nozaki, as treze refinarias da companhia possuíam capacidade para abastecer mais de 90% do mercado interno brasileiro. “A Petrobrás está se desfazendo dessa capacidade com a justificativa de que para ela é mais rentável concentrar a exploração no pré-sal e, quando se retira do setor de refino, abre espaço para empresas privadas ocuparem”, afirma.

Política de desmonte

Saindo do mercado de refino, a Petrobrás corrobora para que o Brasil necessite de maiores nível de importação de derivados de petróleo, o que, segundo William Nozaki, fortalece a atuação de importadores defensores do Preço de Paridade de Importação (PPI) no país – responsável pelo aumento nos preços dos combustíveis aos consumidores. “Vendendo as refinarias, a estatal abre espaço para os importadores defensores do PPI ganharem força e presença no mercado brasileiro”, explica.

A política de desmonte para atração de empresas privadas também impacta a classe trabalhadora brasileira, que sente na pele os impactos dessas vendas. Diretora da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Cibele Vieira considera falha a atuação da companhia.

É um absurdo a Petrobrás produzir menos que a sua capacidade instalada enquanto o Brasil aumenta as importações de derivados porque isso impacta diretamente a população, devido às altas nos preços do mercado nacional.

CIBELE VIEIRA, PETROLEIRA E DIRIGENTE DA FUP

Segundo a dirigente, a necessidade de importação por parte da estatal faz com que o seu principal acionista, o povo brasileiro, pague em dólar por combustíveis e alimentos. “Num momento de desvalorização do real, a empresa tem dolarizado seus preços com as importações e obrigando os brasileiros a pagarem como estrangeiros em seu próprio país. A Petrobrás precisa urgentemente exercer seu papel de estatal e olhar para o Brasil”, comenta Vieira.

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