Prática imposta pela direção da refinaria obriga trabalhadores a realizarem aprimoramentos específicos em horário de trabalho

Por Andreza de Oliveira
O Sindicato Unificado dos Petroleiros do Estado de São Paulo (Sindipetro-SP) recebeu denúncias de trabalhadores sobre a obrigatoriedade imposta pela gestão da Refinaria de Paulínia (Replan) da realização de treinamentos específicos interáreas, para funcionários que não estão liberados a praticá-los e em horário de serviço.
A situação, que exige a atenção plena do trabalhador para duas atividades, tem gerado preocupação e insegurança em parte dos petroleiros, pois não permite que o trabalhador pratique com eficiência as atividades em seu posto de trabalho de origem porque, ainda em horário de expediente, precisa cumprir demanda de treinamento específico em outra unidade.
“A empresa quer que o trabalhador conte em todas as áreas de trabalho, e como algumas têm suas especificidades, é uma condução arriscada”, explicou um petroleiro que preferiu não se identificar.
Considerados requisitos obrigatórios para a avaliação de gerenciamento de desempenho (GD) – que influencia na bonificação anual do trabalhador – os treinamentos em interáreas dificultam ao petroleiro concluir efetivamente as metas estabelecidas.
“A gente brinca dizendo que o operador se torna um pato: não sabe voar, não sabe nadar, só sabe o básico de cada coisa”, completou o trabalhador em anônimo.
Treinamento de baixa qualidade
Além da falta de tempo para a dedicação exclusiva ao treinamento, os trabalhadores também reclamam da carência no aprofundamento dos treinos em novas áreas e da baixa qualidade avaliativa ao final dos cursos.
Outro petroleiro que também para não ser identificado, informou ao sindicato que as avaliações por parte da gerência vêm sendo infladas para aprovar os trabalhadores em treinamentos específicos, mesmo que não tenham atingido a capacidade mínima exigida. “O trabalhador realiza o treinamento básico e no documento de instrução operacional, informe fornecido pela gerência, é anunciado que pessoas não aptas estão capacitadas para atuar em determinadas áreas”, afirmou.
Outro problema reportado por ele foi a falta de um especialista capacitado para avaliar os trabalhadores após os treinamentos. Quem realizava esse tipo de procedimento era um profissional técnico assistente da gerência, entretanto, as denúncias recentes apontam que isso não ocorre mais. “Ultimamente esse responsável nem vem participando das avaliações, somente o gerente e um trabalhador de grau pleno”, disse o petroleiro.
Baixo número de efetivo e riscos do treinamento
Problema notificado pelo sindicato desde meados de 2017, o baixo número no quadro efetivo de profissionais da refinaria – que descumpre com o estudo de Organização e Métodos de Trabalho (O&M) desenvolvido pela própria Petrobrás e coloca em risco a segurança da empresa – é evidenciado nesse processo.
“Por conta da falta de efetivo as pessoas não estão conseguindo treinar […] já aconteceu de trabalhadores estarem em treinamento em uma área distante na refinaria e precisarem voltar para seus postos de origem devido à alguma emergência e não conseguirem”, comentou o petroleiro, explicando que os colegas de setor tiveram que dar conta da falta do trabalhador em treinamento.
Outro petroleiro, também em anonimato, comentou que os planos de demissão voluntária, apresentados pela empresa, têm provocado preocupação. “Já estamos operando [a refinaria] muitas vezes abaixo do número mínimo, com esse treinamento tem muitos operadores que só conseguem trabalhar em uma área. Então ficamos apreensivos com os pdv’s e a saída de mais pessoal”, relatou.
A fórmula de falta de dedicação exclusiva, divisão da atenção dos trabalhadores entre treinamento e trabalho e a baixa quantidade de efetivo resulta num ambiente de altíssimo risco, porque em caso de eventuais acidentes, não haverá quantidade suficiente de funcionários para lidar com o problema.
O que pode ser feito?
Ciente das Normas Regulamentadoras (NR’s) e das diretrizes e requisitos estipuladas no anexo II da NR-1, que são aplicados à diversas modalidades de treinamentos, o Sindipetro-SP entende que, para garantir uma segurança mais efetiva, essas regras também caberiam aos treinos interáreas da Replan.
“Se uma empresa se diz preocupada com as questões de Saúde, Meio Ambiente e Segurança (SMS), ela tem que seguir, no mínimo, o que é pregado no anexo II da NR-1, porque qualquer curso tem que adotar um modelo regulamentado pela legislação”, explica o diretor do Sindipetro-SP que coordenou a comissão dos trabalhadores durante a reformulação das Normas Regulamentadoras, Itamar Sanches.
O sindicato alerta que não é contra a realização dos treinamentos, mas sim à falta de objetivos, necessidades, planos, cronogramas, critérios de avaliação, segurança e dedicação exclusiva do trabalhador ao treino. Por isso, alerta a todos os petroleiros que não assumam duas áreas ao mesmo tempo.
O trabalhador que for convocado a praticar o treinamento concomitante ao horário de serviço e com respectivas tarefas já pré-estabelecidas, pode utilizar-se do ‘direito de recusa’. Para isso, tem a possibilidade de utilizar um texto padrão e encaminhá-lo via e-mail à gerência da unidade para a qual responde.