Sindipetro Unificado falou com seu diretor e membro do Coletivo Antirracista, Pedro Augusto, para entender como o sindicalismo pode ser uma ferramenta eficaz na promoção de políticas inclusivas
Por Vítor Peruch | Edição: Guilherme Weimann
No âmbito do setor petroleiro, os desafios enfrentados pelos trabalhadores negros e negras são profundos e multifacetados, incluindo desde a disparidade na distribuição de cargos e salários até a prevalência de condições precárias de trabalho. Por isso, para combater a discriminação racial no Sistema Petrobrás, são necessárias ações concretas e efetivas.
Foi com esse objetivo que surgiu o Coletivo Antirracista da Federação Única dos Petroleiros (FUP), como uma voz ativa que busca não apenas reconhecimento e conscientização, mas medidas práticas para transformar o ambiente de trabalho em um espaço verdadeiramente inclusivo, com equidade racial.
O Sindipetro Unificado conversou com Pedro Augusto, diretor do Sindipetro Unificado e membro do Coletivo Antirracismo.
Quais são os principais desafios enfrentados pelos trabalhadores negros e negras no setor petroleiro, e como o coletivo os aborda?
Em primeiro lugar, podemos avaliar que as funções mais bem remuneradas e com menor exposição a riscos de acidentes e de adoecimento no trabalho estão onde a população negra encontra-se em menor número, como entre os petroleiros concursados, em especial nos cargos de nível superior e de chefia, por exemplo. Por outro lado, se olharmos para as trabalhadoras e trabalhadores das empresas prestadoras de serviço, vamos ver que a grande maioria dessa população é negra. É onde ocorrem as condições mais precarizadas de trabalho e a maior parte dos acidentes, é onde há maior insegurança no emprego e onde os salários são menores. Também são as trabalhadoras e trabalhadores das empresas prestadoras de serviço as mais expostas ao assédio moral e, no caso das trabalhadoras, também ao assédio sexual, além de casos de racismo mais explícitos.
Lutar por uma Petrobrás pública e estatal é lutar por uma Petrobrás mais brasileira, mais negra, é lutar por uma Petrobrás mais indígena, mais nortista e mais nordestina.
Mas entre os petroleiros concursados, apesar da maior estabilidade, negras e negros também estão mais expostos à discriminação racial, pois os obstáculos enfrentados por esses trabalhadores para chegarem até a empresa são maiores e, depois que entram, estão sempre mais pressionados a ‘mostrar serviço’ e provarem que merecem estar ali, ainda mais no caso das mulheres negras.
Para nós, do Coletivo Antirracista da FUP, é preciso que a Petrobrás e as demais empresas do setor em primeiro lugar reconheçam que o racismo existe na sociedade e no ambiente de trabalho, e que sem medidas antirracistas, essas práticas vão se repetir e se ampliar. E essas medidas passam desde a instituição de cotas nos concursos públicos e nas contratações no setor privado, no investimento na formação antirracista das lideranças e da força de trabalho, de forma a promover um ambiente onde o racismo deixe de ser tabu e possa ser realmente enfrentado através de políticas que tenham essa intencionalidade. Pois o racismo não será combatido por acaso, somente se houver ações para isso. Também através da exigência de que as empresas do setor tenham responsabilidade social, oferecendo condições dignas de trabalho e renda, além da segurança no emprego.
“A Petrobrás nasceu na Bahia, o estado mais preto do Brasil, e não foi coincidência as gestões de Temer e Bolsonaro terem tentado tirar a Petrobrás do Nordeste e do Norte do país”
Como o sindicalismo pode ser uma ferramenta eficaz na luta contra o racismo no local de trabalho e na promoção de políticas inclusivas para trabalhadores negros e negras?
O movimento sindical precisa ser antes de tudo um espaço de acolhimento para as pessoas vítimas de racismo no ambiente de trabalho. É preciso que as pessoas vejam o sindicato como aliado, e isso só é possível se os dirigentes tiverem formação antirracista. Também é importante realizar parcerias com organizações e coletivos antirracistas, estimular a criação de espaços onde negras e negros possam se auto-organizar nas direções sindicais, buscando atrair a base, através de atividades e núcleos de formação, com recursos materiais e humanos para promover cursos, palestras e amparo jurídico, quando necessário. Outra frente importante de ação é na elaboração das pautas, para que as políticas de combate ao racismo e de promoção da equidade racial possam ser garantidas nos acordos coletivos de trabalho e no cotidiano de cada unidade.
“MILHARES DE EMPREGOS DESTRUÍDOS [NA GESTÃO BOLSONARO], PROVOCANDO MAIS UMA VEZ A DIÁSPORA DO POVO NEGRO NO NOSSO PAÍS EM BUSCA DE TRABALHO, AFETANDO AS FAMÍLIAS E A SAÚDE DO NOSSO POVO, E PROVOCANDO MAIS UMA VEZ A CONCENTRAÇÃO DE RENDA NOS ESTADOS MAIS BRANCOS E RICOS”
Quais conselhos você daria para as pessoas pretas que acabaram de passar no concurso e estão chegando na Petrobrás neste momento?
É preciso compreender que a Petrobrás que existe hoje é fruto de muito trabalho, da resistência e de um esforço político coletivo dos movimentos sociais, desde a sua fundação, e que ela só vai continuar existindo se as atuais gerações de petroleiros se engajarem nessa luta e tiverem orgulho dessa história. E isso tem tudo a ver com a construção de um país mais justo, igualitário, e verdadeiramente capaz de promover políticas antirracistas, com distribuição de emprego e renda. A Petrobrás nasceu na Bahia, o estado mais preto do Brasil, e não foi coincidência as gestões de Temer e Bolsonaro terem tentado tirar a Petrobrás do Nordeste e do Norte do país. As piores consequências dessas políticas de desmonte e privatização foram sentidas nos estados mais negros, como a Bahia e Sergipe, por exemplo, mas também Ceará, Rio Grande do Norte, Amazonas. Milhares de empregos destruídos, provocando mais uma vez a diáspora do povo negro no nosso país em busca de trabalho, afetando as famílias e a saúde do nosso povo, e provocando mais uma vez a concentração de renda nos estados mais brancos e ricos.
Lutar por uma Petrobrás pública e estatal é lutar por uma Petrobrás mais brasileira, mais negra, é lutar por uma Petrobrás mais indígena, mais nortista e mais nordestina. É lutar por uma empresa que seja uma ferramenta de desenvolvimento e de promoção de uma transição energética justa e que melhore a vida da população brasileira, não só daqueles que trabalham no Sistema Petrobrás. E compreender que essa também é uma política antirracista.